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E os filhos?

Ainda não os tenho, mas tenho percebido que sua educação é o tema que mais preocupa quem os têm na hora de ir ao exterior. Tenho conhecido muitos expatriados com filhos em idade escolar e o consenso entre eles parece ser de que a parte mais difícil da expatriação é a questão da adaptação dos filhos ao novo país e o prosseguimento de sua formação escolar. O assunto é o "número um" na quantidade de preocupações e reclamações, seguido pela questão das dificuldades de adaptação de cônjuges que deixam suas vidas profissionais para seguirem a pessoa amada. Esses dois assuntos são responsáveis por grande parte das insatisfações, discussões e casos de fracasso na expatriação. Não estamos falando, afinal, de férias de fim de ano e nem de alguns meses conhecendo a cultura de um país... estamos falando de mudanças de anos e anos, estruturais. É a tentativa de se tentar manter viva sua cultura, língua e modo de vida em meio a mundos muito diferentes. 


Para este post, contei com a experiência da querida amiga Gabriela, também expatriada e mãe da Malu - linda, meiga e inteligentíssima - de 10 anos que já passa pelo seu segundo país na África!

Como a Gabriela me explicou, os pais devem sempre procurar a escola que possa deixar seu filho mais seguro, confortável e onde o choque cultural seja possivelmente menor, o que nem sempre significa a escolha mais óbvia (simplesmente por na escola mais cara que seu dinheiro possa pagar ou na mais renomada). Aqui no Gabão, os expatriados costumam optar pela escola americana ou pela escola francesa. Como o país é francófono, é comum que os não-provenientes da área francófona nem da área anglófona optem pela escola francesa, que poderá auxiliar na adaptação, facilitando a assimilação linguística e cultural.

Mesmo que seja uma grande mudança para as crianças, elas normalmente aprendem a falar outro idioma com grande facilidade. A existência de outros alunos ou de algum professor que fale a sua língua nativa, no entanto, facilita, deixa a criança mais tranquila nos primeiros dias e é algo a não se perder de vista durante a escolha.  Existem, porém, outros pontos que os pais devem estar atentos, como a questão de como conciliar currículos com os o do país de origem, quando se pensa em um retorno.

A Gabriela optou por matricular a Malu na escola francesa e também numa escola brasileira de ensino à distância. O programa do ensino à distância inclui todas as matérias de uma escola normal no Brasil, inclusive textos de Educação Física, fichamento de livros, exercícios e provas. A cada dois meses a Gabriela recebe o material de estudos e também envia - pelo correio expresso - os exercícios e as provas feitas pela Malu, que são corrigidas e avaliadas pela escola brasileira.

Cabe aos pais a responsabilidade de acompanhar de perto a evolução escolar dos filhos e verificar se a escola de ensino à distância está devidamente credenciada no MEC. Caso a família opte em não levar as duas escolas ao mesmo tempo e apenas validar o currículo ao voltar ao Brasil, é necessário verificar na Secretaria de Educação do seu Estado qual o procedimento a ser seguido.

Outro ponto importante é atentar-se ao fato de que o calendário escolar no Brasil é diferente da maioria dos países. Ao retornar ao Brasil, a criança vai precisar pular ou repetir um semestre. A grande vantagem do ensino à distância é que a criança vai estar seguindo o mesmo calendário do Brasil, sem ser prejudicada futuramente. E ainda ajuda a preservar suas raízes linguísticas e culturais!

É cansativo, no entanto, conciliar duas escolas ao mesmo tempo, tanto para os pais quanto para as crianças. Estas, naturalmente, costumam não perceber claramente a dimensão do esforço dos pais e da riquíssima bagagem que estão recebendo, percebendo, isso sim, a carga enorme de trabalho a que estão sendo submetidas. A família precisa, acima de tudo, ser o grande porto seguro da criança, pois tantas mudanças podem fazer com que ela se sinta deslocada no exterior e até mesmo no Brasil. 

Soma-se à isso as dificuldades e particularidades de cada país. Aqui no Gabão, por exemplo, não há parques de diversão, praças, cinemas, shoppings, grandes livrarias, bibliotecas ou atividades que colaborem na adaptação das crianças estrangeiras... Realmente, é outro mundo! 

É muito comum encontrarmos filhos que se comunicam com os pais em outra língua que não a originária da família (i.e. pais brasileiros que acabam se comunicando em francês com os filhos), ou que entendem a língua dos pais, mas não a falam e, ainda, os que, ao retornar ao Brasil, não conseguem entrar na universidade por não conseguirem escrever em português...

Resta aos pais lidar com mais este desafio da melhor maneira possível (isso que nem entramos na seara dos custos). Os que conseguem, no entanto, deixam aos filhos um legado multilinguístico e multicultural que só pode ser positivo.

Sobre este tema, indico: 

Comentários

  1. Olá Celina,
    Pelo lido está se preparando direito para os filhos. Virão!
    Encontrei há pouco seu blog e li SURPRESO sobre o curso a distância que você mencionou. Cheguei a matricular minha filha no CNED (autarquia sob Ministério da Educação FRANCÊS) por não encontrar alternativa brasileira.
    Seria possível você publicar o nome do curso, ou link?
    Duas brasileirinhas beeem afastadas do idioma pátrio, e os pais, agradecerão imensamente,

    Macedo

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    Respostas
    1. Macedo, tenho conhecimento do ensino à distância do Anglo-Americano do RJ. http://www.angloamericano.edu.br

      Desejo sucesso para essas brasileirinhas e boa sorte aos pais!!! =)

      Abraços!

      Celina

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    2. Este comentário foi removido pelo autor.

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    3. Nossa, muito obrigado Celina.
      Dei uma breve olhada no site e pedi informações, mas se você tiver contato com a Malu que você citou no texto, por favor, pergunte quais outros cursos existem, se é que sabe. Acho que muitos que lêem seu blog tem (ou um dia terão!) interesse na informação.
      Aproveito para elogiar a iniciativa! Desmistificar a África para nós (Brasileiros) ainda é preciso. Conheci pouco do Egito e quase nada da África do Sul. Não dá para dizer que conheço a África..

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  2. Parabéns pelo post, Celina! Sigo seu blog semanalmente e afirmo que é uma fonte extremamente valiosa de informação para um "quarto-secretário". Tenho um filho de 2 anos e mal posso enfatizar o quanto significa para mim quaisquer relatos pessoais sobre esse aspecto da carreira diplomática, a saber, a educação formal de filhos. Muito obrigado e sucesso ao casal!

    Vinícius Silva

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    Respostas
    1. Obrigada, Vinícios! É sempre bom receber essas palavras, elas dão ânimo para continuar os relatos! Boa sorte para você e tenha certeza de que todo o esforço valerá a pena!

      Um grande abraço!

      Celina

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  3. Celina gostaria de saber se o diplomata se ausentar muito da vida de sua família. É possível ser diplomata e mãe? Obrigada

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    Respostas
    1. Olá! Primeiramente, obrigada pela sua visita. Simmm, é possível. Tenho queridas amigas diplomatas e mães, até de gêmeos. Casadas, com gato, cachorro e etc... Vida normal. O que muda são as mudanças de países a cada período de tempo, mas você sempre vai com sua família e os horários de trabalho costumam respeitar as regras trabalhistas. eheheh. Inclusive, há muitos casos de casais diplomatas. Ambos sendo diplomatas, com filhos.
      Estude e vá em frente!

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